domingo, 4 de dezembro de 2011

PERFIL

Manoel Juarez, freqüentou escolas tradicionais de Minas Gerais, estudou até o 2° ano de contabilidade, casou-se e teve dois filhos, mas aos 27 anos, após a morte de seus pais em um acidente de carro, entregou-se as bebidas. Muitas foram as internações e os tratamentos, mas Manoel não conseguiu se recuperar, deixou tudo para trás e hoje ele esta em São Paulo, é morador de rua há quase 10 anos.

Vanessa – Por que você resolveu vir para São Paulo?
Manoel - Eu já conhecia São Paulo, eu vinha para cá quando era pequeno, com meus pais e sempre gostei. E quando eu percebi que depois de muitas internações eu não conseguia me livrar do vício, eu comecei a pensar nos meus filhos, na minha mulher. Eu não podia ficar em casa desse jeito. As crianças já estavam crescendo e entediam o que estava acontecendo. Eles passaram a ter vergonha de mim.

Vanessa Mas, teve alguma situação especifica que fez você tomar essa decisão de vir para São Paulo?
Manoel - Teve um dia que eu cheguei em casa depois de ter passado duas noites fora, eu acho. Eu não cheguei bêbado, mas estava sujo e todo descabelado. Minha esposa começou a brigar, dizendo que não agüentava mais aquela situação e que se aquilo continuasse ia sair de casa. Aí eu preferi sair. Não queria que ela e meus filhos fossem morar na casa dos pais dela.

Vanessa Como foi a chegada em São Paulo? Você procurou por alguém?
ManoelQuando eu cheguei morei com um primo meu no Interior, mas foi por pouco tempo. Ninguém quer um alcoólatra dentro de casa. Eu percebi que incomodava e resolvi ir para as ruas.

VanessaQuais são as maiores dificuldades na rua?
ManoelA pior coisa para um morador de rua é o frio. As pessoas são boas, elas dão comida, tem alguns que trazem sopa, te dão roupa. Mas quando o frio chega é muito ruim, mesmo que eu esteja com roupa e cobertor, o frio é muito grande, o vento parece que vai cortar a gente.

Vanessa Você continua dependente da bebida?
ManoelSim. Eu ainda bebo. Acho que não vou conseguir parar nunca.

Vanessa – Você usa drogas?
Manoel Eu usei uma vez, depois que vim para a rua, mas não gostei. Me deu muita fome.

Vanessa Você já procurou algum tipo de tratamento aqui em São Paulo?
Manoel Agora que eu estou na rua, tudo é mais difícil. Tem muita gente com esse problema, e eu acho que eles preferem ajudar quem tem família. Como eu não tenho ninguém para que eles vão me ajudar?

Vanessa Já pensou em voltar para casa? Procurar sua família?
Manoel Eu penso neles todos os dias. Minha filha hoje tem 17 anos e meu filho 15. Eles devem estar grandes. Mas eu não penso em voltar, eu queria ver como eles estão, conversar com eles,mas eu sou um estranho para eles. Quando eu sai de casa eles eram pequenos, por mais que eles tenham uma lembrancinha de mim, nunca mais seria a mesma coisa. Minha ex-mulher já deve ter casado, vai ver tem até outros filhos. Na verdade acho que ninguém mais lembra de mim.

Vanessa Você tem sonhos?
Manoel Sempre que eu paro para pensar nessas coisas eu fico muito triste. É difícil a situação das pessoas que moram na rua, a gente passa por tanta coisa, por tanta humilhação, as pessoas não entendem que nem todos estão aqui por que querem. Tudo tem uma explicação, um motivo bem maior que fez com que a gente viesse para rua. Tem pessoas aqui que saíram de casa, por causa das drogas, outros por causa de bebida, outros por que não tinham para onde ir, é tanta história, que se eu for te falar, você escreve um livro.

Vanessa Você tem amigos na rua?
Manoel Na rua a gente conhece muita gente, mas acho que não tenho nenhum amigo. Uma hora tem um aqui comigo e quando eu acordo ele já sumiu.

Vanessa Se pudesse dizer alguma coisa para alguém, o que diria e para quem?
Manoel Eu ia dizer para meus filhos nunca beberem, que a bebida não é bom para ninguém. Foi por causa disso que hoje eu estou assim.

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